Disciplina - Cinema

A Revolucao dos Bichos

Cena do filme "A revolução dos bichos"Cena do filme "A Revolução dos Bichos"


As transições sociais ocorreram, muitas vezes, mediante revoluções que, ao longo da história, se mostraram contraditórias no plano ético e moral exprimindo as verdadeiras facetas que o ser humano é capaz de apresentar ou representar quando está no poder.

 
A obra de George Orwell, "A revolução dos bichos", da década de 40, de maneira metafórica trata a questão do poder político com um cunho atemporal não deixando o leitor sair incólume diante das personagens e do cenário expostos dentro de uma linha imaginária literária exacerbada, em forma de fábula.
 
Este Best-seller foi transposto para o cinema em 1999 (EUA) com direção de John Stephenson, dentro de um padrão que não faz fronteira com o glamour hollywoodiano, porém preserva a atemporalidade das articulações políticas satirizadas sabiamente por Orwell.
 
Certamente, a obra literária, para os mais puritanos, tem nuances que o diretor da película não se ateve, entretanto, o intento da tônica do pensamento de George Orwell é exprimido de forma honesta.
 
Os dilemas políticos acontecem e são retratados na Granja do Solar, local onde o proprietário, Sr. Jones, cria animais e tem espaço para o plantio e a pastagem. Os animais sofrem maus-tratos por parte do proprietário e dos empregados, a figura de Jones é vista, pela maioria dos animais, como opressora, mas há consciência por parte deles da diferença do mundo humano e do mundo animal, onde os animais servem, de distintas formas, aos propósitos do Homem.
 
No entanto, o fomento revolucionário se dá a partir do sonho de um dos porcos, Major. Ele expõe seu sonho e propõe uma mudança radical da estrutura política e social do universo dos animais, pois gozariam de direitos até então inimagináveis dentro daquela realidade, promovendo o bem-estar comum, sem a interferência do Sr. Jones ou qualquer outro humano, a tônica ideológica era o Animalismo, regime que contempla somente as necessidades e o bem-estar coletivo animal.
 
Depois da reunião feita no estábulo, na qual todos ouvem as ponderações do porco, apesar de alguns não entenderem e outros argumentarem contra, está instaurada a revolta contra Jones e seus empregados e os animais saem vitoriosos do conflito.
 
A partir dessa revolta, os porcos propõem uma Carta Magna, com sete "artigos", que contemplavam a dignidade e a igualdade das diferentes espécies animais da Granja do Solar e, sem oposição, é aprovada por unanimidade. Essa Constituição deveria ser respeitada e obedecida por todos em prol de uma sociedade justa e igualitária. O único inimigo era o homem e seus costumes.
 
Entre os animais, as figuras políticas de destaque são os porcos, por se manterem no poder e legitimarem a sua política desigual em nome da Revolução dos Bichos.
 
George Orwell legitima duas personagens da extinta URSS, Stalin e Trótski, nas figuras dos porcos Napoleão e Bola-de-Neve (Snowball, no filme), respectivamente. O estabelecimento de relação é notório, pois Orwell foi um crítico ferrenho dos regimes políticos ditos revolucionários que se tornaram verdadeiras contradições dentro dos preceitos da liberdade, igualdade e justiça. Vale lembrar que a obra foi escrita no período da Segunda Guerra Mundial.
 
Como na URSS, os direitos constitucionais não são respeitados pelos porcos, estes os manipulam e os sobrepujam em prol de sua própria vontade e do benefício singular, instituindo algo pior que a ditadura: o despotismo.
 
Confusão e angústia se misturam no cotidiano da granja com as contradições do regime político comandado por Napoleão, porém alguns animais se apresentam como massa de manobra, entre eles o cavalo Sansão (Boxer, no filme), literalmente como figura do idiota útil, que não questiona os atributos e os sacrifícios propostos pelo governo suíno, se conformando em proferir que Napoleão sempre tinha razão e que qualquer coisa era melhor que a volta do Sr. Jones, e trabalha exaustivamente todos os dias.
 
Com o passar do tempo, os porcos vão adquirindo costumes humanos e alterando a Constituição para atender aos próprios interesses. Eles têm consciência da alienação política dos animais, o que percebemos por meio do culto à personalidade de Napoleão e pelos chavões populistas, como camaradas, minimizam problemas e criam um mundo fantasioso de prosperidade e felicidade. Além da preocupação jurídica dos porcos, há também preocupação com a propaganda do governo de Napoleão. Garganta é o porco responsável pelas relações públicas, trabalhando com a manipulação da veracidade dos fatos cotidianos.
 
A propaganda e a manipulação constitucional formam a dicotomia que faz com que os porcos consigam continuar no poder e tirar todo proveito possível a custa de trabalho escravo daquela nova sociedade.
 
Entre várias quebras constitucionais, a de maior destaque está na execução sumária, sem direito ao amplo e contraditório, apenas pela vontade do governo, por não aceitar um contra-argumento.
 
As injustiças se multiplicam, não há oposição direta ao governo. Os porcos começam a estabelecer relações comerciais com homens e passam a andar com duas pernas. Além disso, o discurso de igualdade e revolução caem no esquecimento das novas gerações que não questionam os direitos da sociedade vigente.
 
Os 89 minutos do filme dirigido por Stephenson mostram a crítica aos movimentos revolucionários, um pouco da essência humana nos bastidores do poder e da convivência coletiva, ficando evidente que uma sociedade sem castas sociais e sem líderes é totalmente ilusória e utópica.
 
Os interesses são distintos e, talvez, ainda que intrinsecamente, entre outros, o autor deixe a mensagem de que somente os imbecis mereçam ser governados, pelo fato de não saberem pensar e agir por conta própria.
 
 
Rubens Martins Neto 
Assessor técnico-pedagógico do Portal Dia-a-Dia Educação
Professor de Língua Portuguesa

 

 

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