Disciplina - Cinema

André Faria

Imagem do cineasta e diretor de fotografia André Faria       

André Faria é cineasta, produtor, roteirista de cinema, TV e teatro e diretor de fotografia. Talentoso, foi agraciado com o prêmio Quiquito, do Festival de Cinema de Gramado, pela Direção de Fotografia do filme de Bráulio Pedroso, “Roleta Russa”, além de ser roteirista e diretor do longa-metragem “Prata Palomares”, com o qual ganhou o Prêmio Candango, de melhor Diretor de Longa-metragem, no Festival de Brasília.
Atualmente, André Faria é coordenador técnico da Escola Sul-americana de Cinema e Televisão do Paraná, a CINETVPR, onde é responsável pela seleção dos equipamentos cinematográficos e pela supervisão da infra-estrutura, juntamente com os engenheiros e arquitetos da Secretaria de Obras do Paraná.

1) Por que uma Escola sul-americana de Cinema e TV?

R: Bom, existem dois aspectos: o primeiro é que com uma Escola sul-americana você pode ampliar o mercado exibidor. Exemplo: dentro de uma escola coexistem alunos de diversas nacionalidades que podem trocar os seus filmes, o que, com certeza, facilita a exibição e a distribuição dos filmes feitos aqui no Brasil, e daqueles feitos em outros países da América Latina.

O segundo aspecto, e o mais importante, é o intercâmbio cultural. Acredito que tenha sido essa a idéia da Ittala (Nandi) ao propor uma Escola Sul-Americana de Cinema e TV.

2) Como se deu a implementação e a viabilização da Escola de Cinema e Vídeo aqui no PR?

R: A Ittala Nandi foi convidada por um assessor do governador Roberto Requião, Sr. Haziel Pereira, para verificar a viabilidade de montar uma escola de cinema aqui, em Curitiba.

Em novembro de 2004, passou 2 dias na cidade, e foi levada ao Parque Newton Freire Maia, ficando encantada com o espaço, bem como com as possibilidades de se construir, no Paraná, um excelente complexo de cinema.

Em Fevereiro de 2005, depois de consultar algumas pessoas da área, como Gustavo Dahl, Orlando Sena e o senador Pedro Simon, Ittala voltou a Curitiba com um projeto, onde além da Escola de Cinema - CINETVPR, também farão parte a escola de circo, o cine-teatro, galeria para artes-plásticas, e uma escola técnica (marceneiro, eletricista, operador de câmera, edição) para formação de mão-de-obra especializada.

Quando Ittala telefonou me consultando, eu disse que deveria se criar um pólo de cinema forte aqui no Paraná, pois assim os alunos da Escola poderiam estagiar aqui mesmo no Estado e não em produções de São Paulo ou Rio de Janeiro, o que seria quase inviável. E que pólo de cinema não representa só dinheiro, é feito principalmente de leis de incentivo, isenções de impostos e de Festivais. Por exemplo: O Festival de Cinema de Recife deu muito apoio para que o pólo de cinema de Pernambuco se desenvolvesse, o Festival de Gramado a mesma coisa, hoje temos várias produções realizadas no pólo de cinema do Rio Grande do Sul... Bem, nós já temos uma escola e agora teremos, aqui em Curitiba, de 05 a 11 de Outubro, o Festival do Paraná de Cinema Brasileiro e Latino, que trará muitas pessoas da área do audiovisual, como produtores, diretores, técnicos e atores, dando a oportunidade aos alunos de interagir com os profissionais da área, criando relacionamentos e futuras realizações.

O mercado de trabalho em cinema é bastante difícil no Brasil, sabemos disso e passamos essa noção para nossos alunos. Porém, o mercado de TV não pára de crescer, se mostrando muito forte. Em outros países, grandes diretores da atualidade, como Steve Spielberg e George Lucas, quando saíram da escola, iniciaram suas carreiras fazendo televisão e tocando seus projetos de cinema, até ser possível produzir o primeiro longa-metragem.

A partir disso, a CINETVPR, preocupando-se com a profissionalização desses estudantes, se transformou, também, numa escola de televisão e, no último ano de curso, os alunos trabalharão intensamente com essa mídia.

3) A CINETVPR ainda é pouco conhecida pela população em geral, mesmo assim conta com grandes nomes da área do audiovisual em seu quadro docente. Como vocês conseguiram atrair tanta gente boa?

R: Realmente, na CINETVPR contamos com profissionais extremamente qualificados, difíceis de se trazer pra cá pelo intenso trabalho que desenvolvem na área de cinema e televisão, como o Francisco Ramalho Jr., que está produzindo filmes internacionais e ministra aula de Produção.

Optamos por convidar profissionais da aérea que estão dando aula há vários anos em universidades como PUC, Estácio de Sá, Fundação Getúlio Vargas, UniRio, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Esses profissionais, sabendo da grande importância desta escola, aceitaram o desafio e se dispuseram a passar todo o conhecimento que têm aos nossos alunos.

4) Qual é o perfil exigido para compor o quadro docente da CINETVPR?

R: Se você tem como objetivo criar uma escola de excelência, que realmente ensine cinema e TV, o perfil exigido é bastante complexo. É necessário um professor que tenha experiência de sala de aula, que domine a didática e a pedagogia do ensino e que tenha também o conhecimento e a prática de cinema e televisão. Hoje, nosso quadro se compõe de 25 professores, 11 da FAP – Faculdade de Artes do Paraná-, 5 professores de Curitiba, como o Fernando Severo, André Rassi, Sanjai Cardoso, Marcos Ribeiro e o Beto Carminatti, diretores e técnicos paranaenses e professores de cursos de cinema em outras escolas aqui em Curitiba, e no eixo Rio/São Paulo

Alguns professores da FAP, ligados à área de cinema, estão ministrando aulas na CINETVPR, como a Berenice Mendes, diretora paranaense conhecida, e o diretor também paranaense Paulo Munhoz, professor da disciplina de Animação, que lançou há pouco tempo o longa-metragem “Brichos”. Temos também nomes como: Rosane Beyer, Beto Meira, Marcelo Almeida, Marcos Camargo, Percy Klein, Eduardo Baggio, Solange Stecz, Rosemeire Odahara e Ana Lesnovski.

O objetivo é reunir professores concursados e contratados pela FAP e outros especialistas na área, que possuam “notório saber”, para ministrar cursos de extensão, como os Diretores de Fotografia Alziro Barbosa e Lucio Kotado e o especialista em documentários, Evaldo Mocarzel. Também temos professores como: Pedro Camargo, Walter Lima Jr. e Emiliano Ribeiro, diretores; José Dias, diretor de arte; Wilson Rocha, roteirista e Reynaldo Boury, diretor de televisão.

O Curso de Cinema e Televisão, como outros cursos de graduação, conta com disciplinas obrigatórias e matérias opcionais. Para as opcionais já trouxemos especialistas em algumas áreas, como o Alberto Flaksman (CONCINE) para falar sobre o mercado de cinema. Trouxemos, também, o Erick Rocha, filho do cineasta Glauber Rocha, para falar sobre o seu último filme, feito em Cuba. O Orlando Sena (MINC) para discorrer sobre o Cinema Novo, bem como a Vera Zaverucha (CONCINE), pois foi ela quem implantou e escreveu o livro sobre a Lei do Audiovisual.

Esteve aqui, ainda, o Tom Job Azulay, que participa das discussões do CONCINE no Itamarati. Ele veio falar, entre outras coisas, sobre o “Film Commission”, uma organização internacional não-governamental que tem por objetivo viabilizar produções.

Trouxemos esses profissionais para tratar de mercado, porque os alunos precisam saber que são eles que sairão atrás de patrocínio ou leis de incentivo para viabilizar seus projetos.

Esteve aqui também Cláudio Valentinetti, profundo conhecedor do Cinema Novo, para comentar as influências do neo-realismo italiano no Cinema Novo brasileiro. Cláudio escreveu um livro sobre o diretor Glauber Rocha, quando este ainda estava na Itália. Fechando o Ciclo a respeito do Cinema Novo, vieram Zelito Vianna e Carlos Reichenback Filho.

Para o ano que vem, nossa programação é trazer alguns diretores contemporâneos, para comentarem a nova linguagem do cinema brasileiro.

5) O Governo Estadual pensa em transformar o PR em um pólo de cinema. Como isso deve acontecer?

R: Esse pólo servirá para produzir atividades cinematográficas e televisivas dentro do Paraná.

O processo deve acontecer da seguinte forma: um diretor/ produtor que já obteve apoio de alguma Lei de Incentivo ou patrocínio, apresenta seu projeto na Escola e requisita um estúdio e equipamentos para seu filme. Em contrapartida, alguns alunos serão escolhidos para participar da produção como estagiários.

Aqueles alunos que não estiverem participando da equipe como estagiários, também poderão acompanhar todos os trabalhos, por meio de uma sala (aquário), tendo condições de visualizar tudo que está acontecendo no set de filmagem. Será uma troca, a escola dará ajuda aos produtores e estes auxiliarão os alunos a colocarem em prática os conhecimentos aprendidos em sala de aula.

Outro ponto importantíssimo é que os produtores, utilizando o espaço da escola, minimizam os custos de produção de seus filmes, favorecendo o desenvolvimento do cinema no Estado do Paraná.

As normas que vão gerenciar o pólo estão isentas de qualquer tipo de censura, seja política, partidária, pornô-erótica, etc. Se você cria uma base bastante sólida com os alunos, que também opinarão na escolha de qual projeto seria mais interessante, com certeza deverá ganhar aquele que proporcionar um maior grau de aprendizagem para os estudantes.

6) Nosso mercado é muito carente de profissionais da área do audiovisual. Além de uma Graduação em cinema, a Faculdade pretende oferecer cursos técnicos? Quais? Quando?

R: A Escola Técnica deverá ser montada a partir de um projeto com a SEED – Secretaria de Educação do Estado do Paraná, oferecendo cursos técnicos de Carpintaria, Cenografia, Maquiagem, Eletricista, Operador de Câmera, entre outros. O objetivo é para agosto de 2008. O projeto já foi discutido e viabilizado com o secretário da Educação, Mauricio Requião.

7) As inscrições para o Vestibular da FAP e da CINETVPR já estão abertas. Hoje, a Faculdade oferta apenas 30 vagas por semestre e as aulas são durante a tarde. Existe a possibilidade de ampliar o número de vagas e oferecer um curso noturno?

R: Já sabemos que o número de vagas oferecidas é muito pouco, pois a procura é de 500, 600 pessoas, que disputam 30 vagas, mas a diretoria da FAP entendeu que
ficaria inviável mais de 30 alunos por turma. Porém, não foram previstas as desistências e nada impede que a FAP, por meio do Conselho Estadual de Educação, tente ampliar esse número.

Imagem do laboratório de edição e montagem do CINETVPRQuanto ao curso noturno, ao iniciarmos o projeto da escola, nossa idéia era de que fosse uma escola que tivesse um objetivo político-social, ou seja, um curso gratuito, que recebesse alunos de baixa renda, com o firme propósito de revelar novos talentos.

A partir de agora, a idéia é viabilizar um turno pela manhã ou à noite. O pedido dos alunos, que já estão na escola, é para que as aulas sejam no período matutino, assim sobraria a tarde e a noite para trabalharem nas televisões ou produtoras de Curitiba.

8) Semana que vem começa a 2ª edição do Festival do Paraná de Cinema Brasileiro Latino. Fale um pouco sobre essa iniciativa pioneira na cidade.

R: A melhor pessoa para falar sobre essa iniciativa é a Ittala, que está na cabeça do projeto. Mas eu vejo, como a principal função desse Festival, o fato de que os alunos estarão em contato com muitas pessoas da área do cinema e da televisão, podendo entrevistá-los, debater, enfim, receber informações e conhecimento a respeito da área que estão estudando e pretendendo se profissionalizar.

9) Qual a sua visão sobre a relação Educação e Cinema?

R: A partir da minha longa experiência com a gravação de aulas e programas educacionais para o Ensino a Distância, comecei com o projeto Mobral em 1970, (tô velho gente!) descobri que o audiovisual pode auxiliar o ensino por meio da exibição de filmes que exemplifiquem o conteúdo que o professor deverá abordar.

Um dos recursos mais importantes para o processo de contextualização é o filme. Por exemplo: o professor quer falar sobre algo que não teve nenhuma vivência, traz um trecho de filme, exibe na sala de aula e pode contextualizar o conteúdo.

Como suporte para o ensino, acho que o cinema tem um papel fundamental. Da mesma maneira que os professores precisam entender e saber utilizar esse recurso como apoio pedagógico, a turma que faz cinema também deve conhecer as necessidades desse tipo de trabalho, pois quando se está roteirizando um filme pode-se pensar a respeito, desenvolvendo seqüências de cenas que auxiliem no entendimento de certos temas. Ou seja, o objetivo é de cada vez se ter uma interação maior entre o ensino e o cinema.

10) E como você, um diretor premiado, decidiu contribuir neste projeto de tornar o PR um pólo de cinema?

Imagem do CINETVPR (interna)R: Meu primeiro trabalho, ainda no Rio de Janeiro, como estagiário de cinema, foi em “Garota de Ipanema”, do Leon Hirschman, em 1967. Depois disso, me profissionalizei em todas as etapas da produção, onde conheci muita gente, fiz muitos amigos e adquiri muito conhecimento. Durante esse período, no Rio de Janeiro, existia o Cine Paisandu, que era um cinema de arte. Lá tive contato com toda a turma do Cinema Novo. Foi uma grande escola o Cine Paisandu, formou muitos cineastas.

Eu gostaria de ter tido uma escola, para aprender a fazer cinema, e não tive. Aprendi observando o que as pessoas faziam, lendo muito, assistindo diversos filmes e também carregando muita cabaria, grua e tripé em caminhões, ufa!

Participei da construção de vários estúdios e da compra de equipamentos em diversas produtoras. Como trabalho em Curitiba desde 1986, a Ittala me chamou para ajudá-la a montar a escola, e me convidou para ser o Coordenador Técnico da CINETVPR. Apresentei um projeto, onde sou o responsável pela definição das aquisições de material técnico cinematográfico e pela construção dos estúdios.

Durante esses 21 anos que moro e trabalho em Curitiba, participei de várias reuniões, com a AVEC, SATED e Fóruns de Cultura, nas quais pude observar a grande dificuldade que as novas gerações têm para realizar seus projetos cinematográficos, e sempre pensei que um pólo de cinema no Paraná poderia resolver grande parte dessas dificuldades.
Portanto, este foi o principal motivo que me levou a aceitar mais esse desafio.

11) Você já dirigiu muita coisa, mas como pude perceber, por meio de seu currículo, seus estudos estiveram mais voltados para a Direção de Fotografia. Como é, para você, o trabalho de Direção Geral de um filme, tendo como base a sua experiência de Diretor de Fotografia?

R: Bom, para responder a essa pergunta, é inevitável lembrar que trabalhei em várias áreas da produção cinematográfica.

Sempre escrevi roteiros e peças teatrais. A minha vontade era de dirigir minhas próprias histórias, mas as primeiras oportunidades que tive na área foram com a Fotografia. Trabalhei com o Ricardo Aronovich, excelente Diretor de Fotografia, que me ensinou os contrastes, os meios tons e a pintura de um quadro através da iluminação. Com o David Zing me ajudou a trabalhar o olho pra ver luz natural, brilho e enquadramento. Com Afonso Beato, que me ensinou a fotometrar a difícil luz da caatinga brasileira.

Com toda essa experiência, ganhei o Prêmio Kikito, em Gramado, como melhor Direção de Fotografia de longa-metragem com o filme “Roleta Russa”, de Bráulio Pedroso, já no primeiro filme que fotografei.

Mas, o que mais me encanta é mesmo a direção: a mecânica de atores, o enquadramento. Curto muito a direção de ator, não gosto desse estilo novo em que se diz que basta encontrar um bom ator e ele já sabe o que fazer, pois acho que uma das partes mais gostosas da direção é justamente trabalhar a interpretação das personagens.

12) Quais são seus próximos projetos individuais como cineasta?

R: É claro que a gente sempre está querendo dirigir um filme (risos). Mas no momento eu quero terminar o projeto da CINETVPR e acredito que em dois anos a gente consegue deixar tudo funcionando. Aí, vou para meu sítio em Guaraqueçaba desenvolver umas idéias que tenho, escrever roteiro pra cinema, peça pra teatro, programa pra TV, quero passar um período fazendo isso. Meu projeto futuro é escrever.

Mas claro, não descarto a idéia de fazer um longa-metragem. O vírus cinematográfico continua.

Por: Angela Letícia Nesso em Abr/2008.
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